O que é feito de ti, Tenorio?


O triste fecho da fábrica das “nossas” bolachas Triunfo fez-me lembrar o atum Tenorio. 
O meu pai sempre comeu atum Tenorio, porque era o melhor, dizia ele. Eu habituei-me a comer atum Tenorio porque era o melhor. Continuei fiel à marca. Abria-se a lata e lá dentro estava um filete de atum inteirinho e direitinho conservado em azeite. Até a lata tinha mais qualidade. Era mais cara, claro. 
Há uns tempos atrás o atum Tenorio começou a subir prateleiras na estante do supermercado,cada vez que ia à procura dele encontrava-o mais acima até que um dia desapareceu. 
Não queria acreditar. Fui perguntar à menina que não me soube dizer nada para além de confirmar que há uns tempos não aparecia. 
Um dia voltei a encontrar o Tenorio, fiquei toda contente e fui a correr buscar um monte de latas, quando as agarrei nem queria acreditar, mudaram as latas!! Agora estão iguais às de todos os outros atuns…. mas pronto esperemos que a mudança seja só por fora… pensei eu. 
Mas qual não é a minha tristeza quando ao abrir a primeira lata “normalizada” do atum Tenorio, constato que também o conteúdo foi normalizado, agora temos farripas de atum .. banhadas em óleo. Está mais barato e volta a ocupar as prateleiras de honra da estante do supermercado…. 
Claro que o Tenorio chegou a um ponto em que só tinha duas hipóteses ou se rendia ou morria. 
Optou por baixar a qualidade, reduzir custos e transformar-se num atum igual a todos os outros. E ainda teve esta benesse porque é uma marca de referencia. Mas provavelmente não tarda estão a ser convidados a baixar mais preços, a dar mais rapel … até ao dia em que o Tenorio desiste.

Nunca compro produtos brancos. Acredito que tenha a ver com o facto de estar nos dois lados da barricada, sou consumidora mas também produtora e tenho perfeita noção de que a diferenciação é a nossa maior senão única mais valia. Só temos valor enquanto produzirmos algo único e insubstituível. Só temos valor enquanto os consumidores exigirem a nossa presença. 
Chegados aos produtos brancos chegámos ao tanto faz. Tanto faz quem os produz, onde se produzem, o que interessa mesmo é que  encham as prateleiras de todas as grandes superfícies num exercício de narcisismo, repetindo à exaustão o respectivo nome, e que sejam mais baratos do que qualquer marca que produza qualquer coisa idêntica. 
Dito isto as marcas vão morrendo, mais depressa ou mais devagar vão desaparecendo, numa primeira fase empurradas para as prateleiras o mais longe possível do olhar, e finalmente para fora da loja. 
E já do lado de fora são convidadas a voltar, mas agora orgulhosamente anónimas, dentro  da grande família " branca" que se dispõe a adopta-las, dentro de determinadas condições, claro. Afinal ser convidado a fazer parte dos Brancos deve ser considerado uma honra.  
É verdade que se deixa de ter nome próprio, e se é aconselhado ( amigavelmente) a obedecer às regras. E a partir daí passa imediatamente a ter um lugar de destaque em todas as prateleiras centrais de todas as grandes superfícies de norte a sul do país e aumenta as vendas para milhares de milhões.
Mas a partir daí deixou de existir, sem nome próprio deixou de fazer falta, deixou de ser importante. E se pensa que em quantas mais prateleiras estiver mais importante é, desengane-se... Foi mesmo nesse momento que deixou existir. 
Agora estão " reunidas as condições" para o tanto faz. Tanto faz quem produz ou onde produz, agora só interessa o preço: barato, muito barato, cada vez mais barato.
E no dia em que perceber que não consegue produzir tão barato, vem outro , nem que seja do outro lado do mundo,  e produz. 

Quem pode evitar que tal aconteça? O consumidor informado, consciente e preocupado para quem o ato de consumir é muito mais do que apanhar o produto mais barato que houver na prateleira. 

5 comentários:

  1. Olá!
    Por acaso em casa também se come D. Tenório...e são 2 "filetes" inteiros...o Bom petisco é que realmente em farripas ( melhores para fazer patés, etc)....Obrigada pelos inputs, são sempre muito interessantes.
    Cps,
    Cristina

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  2. O Tenorio nunca experimentei, mas aconselho vivamente o filete de atum em azeite biológico, em frasco de vidro. É delicioso! Das marcas brancas subscrevo totalmente!

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  3. Eu não sou produtora, sou só consumidora, mas concordo com tudo o que escreveu neste post.
    Uma frase que digo muitas vezes, para os outros e para mim, é "De cada vez que gastamos dinheiro estamos a votar no tipo de mundo que queremos ter."

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  4. O atum Tenorio continua a ser o melhor! Sempre o comprei porque já os meus pais o faziam. Marcas brancas não obrigada!

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